Quando, no meio de um filme, Carlão Reichenbach tinha vontade de fumar e saía da sala, queria dizer que não estava gostando do filme.
Já eu tendo a esquecer de beber água quando o filme me interessa. E engoli uma garrafa inteira durante “O Regresso”. Não foi o único sintoma: com uma hora e meia de filme eu já procurava o relógio para saber quanto ainda faltava. E acho que tinha uns alfinetes na poltrona, porque eu não conseguia acomodar a bunda de jeito nenhum.
O roteiro é bem fraco e de uma previsibilidade quase doentia. A direção é pesada, monótona em sua grandiosidade. Mas o vilão dá vida à trama, porque é um canalha 100% e permite a Di Caprio sofrer o bastante para ganhar, finalmente, o prêmio de melhor ator que devia ter ganho já há anos. A sequência do ataque do urso é genial. Há alguns outros momentos bons, mas no meio de muita convenção.
Em todo caso, me pareceu razoável que não ganhasse o prêmio de melhor filme. A Academia não fechou questão em torno de um filme só.
Assim, uma penca de prêmios do setor Direção de Arte e ainda montagem foram para “Mad Max”. É um “remake” que teve a sorte de ter sido feito pelo mesmo cara que o inventou, George Miller, e que bem podia ter ganho o prêmio de direção pelas tiradas inventivas da primeira parte. Mesmo na segunda, a da perseguição, há bons momentos, mas essas perseguições me deixam mortalmente indiferente: são inutilidades, basicamente.
Ainda não entendi a razão de “Spotlight” ter sido escolhido melhor filme: correção política? bom-mocismo? Em todo caso vou buscar uma comparação modesta com filmes de jornalismo: “Todos os Homens do Presidente”. Também história sobre caso célebre (o Watergate e tal), mas é uma coisa muito mais cerrada do que aqui.
Está certo, aqui há todo um processo, mesmo dentro do jornal, para abordar a questão. E se passa de raspão pelo que me parece mais interessante: a cumplicidade entre a política local, a Igreja católica e o jornalismo. Esse era o osso, a essência da história.
Depois os jornalistas saem atrás do caso e ficam se espantando. O elenco tem fragilidades enormes, uma delas me surpreendeu, porque veio de Mark Ruffalo, outra não, de Rachel McAdams. Já o Michael Keaton está muito bem.
O filme que mais me fascina nesse grupo é “A Grande Aposta”, que salvo erro só ganhou roteiro adaptado. É o melhor filme na tradição contador de história desse grupo. A partir de alguns investidores explica como os bancos e similares trapaceiam alucinadamente antes de chegar à crise de 2008.
Explica como trapaceiam, insisto, mas explica também como esse tipo de mecanismo pode ser explorado por esse ou aquele, mas permanecerá sempre incompreensível ao leigo. Não sei se a intenção foi essa, mas o resultado foi interessante.
Negros
Os negros de primeiro time estiveram todos ausentes. Alguns “has been” apareceram. Chris Rock falou algumas coisas sensatas antes de invadir o terreno da galhofa. Então em 1962 ninguém reclamava de não haver negros indicados porque eles estavam muito ocupados tentando escapar de linchamento ou lutando para sentar nos bancos da frente dos ônibus? E hoje temos um presidente negro nos EUA?
Ok. Mas isso quer dizer que se deve abaixar a guarda e permitir que a polícia viva matando jovens negros e depois os policiais serem absolvidos?
A questão simbólica não é secundária, longe disso.
Por isso me pareceu vergonhoso, se bem entendi, Spike Lee ter aceito um Oscar honorário.
Vince Gilligan
O criador de “Breaking Bad” e, agora, de “Better Call Saul” entende que é preciso prender o espectador dando-lhe o mínimo de informações. A escansão é fundamental. Nada desse cinema de cócegas nos olhos que vigora de monte no cinema americano fora do tempo do Oscar.
Com isso, produz personagens e situações fortes sem ceder a um público que se acredita cada vez mais dispersivo.
Não há grandes diretores, Clint Eastwood á frente, que não cedem a isso e vivem muito bem?
A superioridade das séries para TV sobre os filmes, hoje, passada a novidade, me parece um tanto exagerada. Mas Vince Gilligan é um nome a reter.