A Flip, vi este ano, em que fui lá pela primeira vez, não é exatamente o lugar para conhecer ideias novas.
Mas ali sabemos o que se está produzindo, no mundo e no Brasil.
Por vezes isso pode chegar misturado a interferências políticas ou outras. Mas chega.
Um dos fatos que mais me impressionaram foi a presença rala da ficção.
Pode-se dizer que lá estava o Padura, grande estrela da festa, o que é verdade.
Mas a impressão (a minha, em todo caso) foi de que a história, a sociologia, a neurociência, o cartum, a poesia, a demagogia, os números de foca amestrada…
Enfim, quase tudo dá a impressão de dar mais conta do mundo, hoje, do que a ficção.
Me lembro do Alcir Pécora dizendo, há algum tempo já, que os estudos literários hoje interessam mais que a literatura.
Não é? Mas sem literatura daqui a algum tempo não haverá estudos literários.
A imaginação parece já não dar conta do mundo.
A prova na literatura vem das biografias: quanto mais se sabe que um personagem existiu – Churchill, Stalin ou lá quem seja – mais se acredita no que se lê.
Para os filmes existe a necessidade cada dia mais óbvia do “baseado em fatos reais” inserido antes da primeira imagem. Aí o espectador sabe que aquilo, mais ou menos, aconteceu.
Isso não me parece uma falta gratuita de crença do leitor/espectador. Existe uma incapacidade do texto ficcional de dar conta do mundo e, assim, arrastar a nossa crença.
Terá por acaso existido Dom Casmurro? E Capitu. E o pai Goriot? Emma Bovary. Joseph K… E os livros que Borges inventa para comentar. Existem?
Que importância tem? Que diferença faz? A rigor, nenhuma.
É a nossa incapacidade de fazer sonhar que parece reger as escolhas da Flip, que, aliás, correspondem às dos leitores, ou buscam corresponder, em todo caso.
Por que isso acontece? Aí vamos aos estudos literários, à questão do romance burguês etc.
Tanto no cinema como na literatura, parece que a margem de invenção está mais estreita.
Como perguntava Lênin: Que fazer? Que ficção?