É incrível como se pode vez por outra encontrar jornalismo de primeira, inesperadamente.
Eu dava uma espiada no Uol, na quarta-feira, quando topei com a história de quatro meninos, menores, e havia ainda um de maior (não lembro se eram três menores e o maior, mas enfim…).
Isso aconteceu numa pequena cidade chamada Castelo do Piauí. O certo é que eles sequestraram quatro meninas, depois as estupraram, e prenderam, e atiraram de um barranco. Para matar mesmo. Uma morreu, duas estão hospitalizadas.
Os garotos quase foram linchados. E de cara eu entendi porquê.
Os jornalistas, de um site piauiense chamado “O Olho” (não tive tempo de tentar descobrir se também é um jornal) levantaram a ficha dos meninos, que era de assustar: várias passagens pela polícia, internamentos, viciados em drogas, crimes diversos.
Já estava bem e dava para entender que um crime horrendo desses era coisa de monstros que vinham treinando para chegar a essa condição.
Mas os jornalistas não ficaram por aí. Descobriram outros traços comuns entre eles, embora eles proviessem de regiões diferentes. Por exemplo: todos eles tinham largado a escola há muito, são semianalfabetos. Provêm de famílias complicadas, invariavelmente desestruturadas, com histórias de loucura e abusos.
Um dos garotos, aliás, era quem impedia um irmão de violentar a irmã…
O jornal publica um belo editorial a respeito, começando com uma questão mais ampla e muito interessante: por que os homens têm medo das mulheres? E por que as mulheres têm medo de homens?
Desculpe, são evidentemente duas questões. Logo há uma resposta rápida: os homens têm medo de que as mulheres riam deles. As mulheres têm medo de que os homens as matem.
O editorial nos lembra que a palavra “monstro” é a mais pronunciada nos programas sensacionalistas de TV. E depois defende que esses meninos não devem ser chamados assim.
Partilhei isso tudo no facebook do Curso Inácio Araujo. Não sei se chegou, porque não entendo patavina disso.
O importante é que são coisas muito lúcidas, além do trabalho de reportagem notável, o que se diz ali. Não é a Eliane Brum, não é nada disso… É um jornal ou site de que nunca tinha ouvido falar na vida.
Trabalhou como um jornalismo de fato investigativo de primeira linha, e isso num momento em que o Congresso, às cegas, prepara-se para tomar uma medida tão cretina quanto inócua (no sentido de repressão à criminalidade, porém nociva para os “de menores”, ou seja, para a sociedade), que é a diminuição da maioridade penal.
Isso fará a alegria do sensacionalismo, por vários motivos, entre eles porque vai aumentar muito a taxa de menores passíveis de recuperação, e que se tornarão irrecuperáveis, cada vez mais criminosos, mais carregados de ódio, mais separados de nossa sociedade e, portanto, incapazes de nos reconhecer como seus semelhantes, e portanto dispostos a nos liquidar na primeira ribanceira que apareça.
O ministro do MEC
Estava interessante o “Roda Viva” com Renato Janine Ribeiro. Mesmo a questão sobre como se sente um professor de ética como ele trabalhando para um partido que não anda dando grande bola à ética, foi respondida com classe e recebida com respeito.
Mas aí o apresentador entrou com essa bobagem que é acreditar que, como o PT pretende nos transformar numa nação de analfabetos, o MEC há alguns publicou um livro ‘didático preconizando que seria “certo” ensinar o aluno a escrever “nóis vai” ou algo assim.
Isso é uma simplificação brutal de trabalhos de linguistas, com os quais se pode concordar ou não, mas que não são simplesmente tirados da cartola.
É algo que faz sentido, em todo caso. Não que se ensine isso como certo na norma culta, mas que não convém de primeira assinalar como errado, por uma razão: muitos alunos trazem esse tipo de construção de casa, assim falam seus pais. O professor dizer que os pais estão simplesmente errados tem como resultado afastar o aluno ou da escola ou da família. Uma e outra estarão em posição opostas, de todo modo. Será isso o que se deseja?
Bem, isso digo eu aqui, que não entendo patavina disso, nem sou professor.
Mais direto, Renato Janine explicou que no cotidiano vemos muitas coisas erradas. E saiu com um exemplo clássico: a confusão entre “de encontro a” e “ao encontro de”…
Erro de muitos de nós jornalistas. Entre outros que vivemos praticando, eu inclusive.
O fato é que todo mundo fez que não era com ele e mudou de assunto.