Godzilla 21

Por Inácio Araujo

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A inegável vantagem de Godzilla sobre outros monstros e heróis é que entre um filme e outro vai sempre uma distância razoável. É uma grande vantagem sobre, digamos, O Homem Aranha, que não sai de cartaz.

O último Godzilla ainda foi no século passado e não me lembro bem qual era o ponto. Apenas que Nova York era um alvo preferencial.

Desta vez a questão é a natureza. De certa forma estamos de volta às origens.

Godzilla foi, em sua viagem inaugural ao nosso mundo, uma decorrência das bombas de Hiroxima e Nagasaki. De lá para cá muitas outras vezes o atômico se mostrou tanto problemático (ameaçador, pelo incontrolável de sua força) quanto indispensável (para suprir energia).

Godzilla representa em grande medida esse impasse do humano: não pode ficar sem essa energia e não tem como suprimir seus riscos.

Godzilla é a representação mais evidente desses riscos, embora aqui surja cercado de outros dois monstros dispostos a tomar-lhe o lugar.

Então, o Godzilla do século 21 (o primeiro, em todo caso) se apresenta como um monstro ambiental: é o desastre do homem em sua relação com o ambiente que o leva a surgir e agir.

O ponto é, digamos, genérico. Para adensá-lo providenciou-se um inimigo: o militarismo. Não é nada implausível. O problema é que toma conta do filme (para efeitos de espetáculo). E temos então, novamente, aquela lenga-lenga de mil movimentos bélicos contra um adversário que, sabemos, de início, não vai nem sentir cócegas com nossas balas.

Pior, o E.T. (pois Godzilla é um E.T., nada mais, com a diferença que vem das profundezas da Terra) em questão se alimenta de energia. Atômica, se possível. Então, todas as nossas ogivas só servem para torná-lo (torná-los, pois como disse que há outros monstros na parada) mais forte.

Outro ponto que nos últimos tempos frequenta quase todos os grandes filmes americanos grandes é a família. Família se une, família se separa, família tenta se encontrar, família na fotografia… Pô, que saco!

Essa onipresença familiar o que pode significar?

Talvez, não sei, seja expressão de um mundo em que as relações interpessoais tornaram-se tão violentos que valores como amizade ou solidariedade grupal tendem a desaparecer. Nem a nação, velho amor do cinema, aparece na história, a não ser como figuração.

Sei que essa pletora de amor familiar já passou dos limites.