Estranho vocábulo, este. Significa, ao mesmo tempo, o trabalho de polir a pedra, de torná-la perfeita, preciosa, e o ato de apedrejar.
Pode significar, subsidiariamente, o ato de educar, de refinar o conhecimento.
Pois bem, no Rio Grande do Sul, uma menina de 13 anos foi lapidada por duas amigas (se é que se pode empregar o termo), antes de ser jogada num rio…
Parece que isso não nos envergonha demais.
Bem menos do que um aeroporto com filas, em todo caso.
O caso só nos interessará se encontrarmos as duas amigas e possamos, enfim, linchá-las.
Beleza!
Para alguns, isso é culpa do Estado (claro, é sempre o Estado. Podia-se, com um pouco mais de largueza, culpar a Existência).
Pois o Estado não está presente e então resolvemos as coisas à nossa maneira – esse é o argumento…
Bem, nesse caso o Estado precisa estar em cada rua, em cada praça.
Em suma: o Estado não está dentro das pessoas, ou de algumas delas, ou de uma parte considerável delas.
Então podemos lapidar os outros com a consciência leve.
Ou, como se pode também dizer das belas obras: é lapidar!
As palavras
Alguém se dispõe a transcrever Machado de Assis para os dias presentes.
Li um parágrafo.
Obviamente não é contemporâneo como Machado.
É apenas uma coisa sem talento.
E por que se leria um Machado sem Machado?
Qual a vantagem?
Se o leitor se desinteressa porque não entende aquilo, que se desinteresse: ou mais tarde ele reverá aquilo ou não vai nunca desfrutar dessa beleza. Ou então um dia ninguém mais entenderá Machado (e quantos mais…), ninguém mais se disporá a explorar um vocábulo no dicionário e a nossa língua morrerá, como tantas coisas morrem.
Será melhor isso do que prostituir a obra de um grande escritor.
(A propósito: se não se entende um autor do século 19, por que não se recomenda um atual, com vocabulário mais próximo? Do que serve um clássico se não á para ser lido? E o que é a escrita senão as palavras que se escolhe usar, em determinado momento da vida e da história, num certo lugar?)